Haver mais ou menos partículas suspensas na coluna de água influencia a capacidade, ou incapacidade, de os peixes caçarem à vista.
É este o factor limitante, aquele que faz com que os peixes não consigam ver as nossas amostras como gostaríamos. Isso pode transformar um bom dia num verdadeiro pesadelo de capturas zero.
Foquemos pois a nossa atenção na questão visibilidade e no que ela pode influenciar a nossa pesca. Se no número anterior o enfoque foram as tempestades e as algas que elas levantam dos fundos, hoje vamos analisar a questão da luz ambiente natural, ou da sua ausência.
As mudanças de luz que ocorrem durante um dia completo são enormes. Passamos de uma escuridão total, a noite, para uma iluminação total, o dia. No meio disto, existe tudo aquilo a que chamamos de “boas condições”, períodos de transição dia/noite ou o inverso, e que nos interessam sobremaneira para pescar. Todos nós temos um registo pessoal de boas capturas, e se meditarmos bem, elas coincidem com estes períodos de menor luminosidade.
As mudanças de luz, quer a transição da manhã para o dia que se segue ou a do entardecer, o ocaso que anuncia a noite, são momentos perfeitos para lançarmos as nossas amostras.
É precisamente nesse período que conseguimos os melhores resultados, porque também é precisamente aí que os predadores encontram as melhores condições para atacar as suas presas.
Sempre que o ângulo de incidência dos raios solares diminui, o peixe aumenta a sua actividade. E se para uns esse momento significa o fim do seu período de caça e a última oportunidade de comer, para outros é apenas o início da sua jornada. Ou seja, de manhã, há um momento em que as espécies nocturnas ainda estão activas, e as espécies diurnas já estão activas.
Em locais onde a quantidade de sedimentos é muito elevada, a diferença entre noite e dia quase não se faz sentir. Tem a ver com o facto de a luz solar não conseguir penetrar fundo.
Aí, a pesca torna-se bem mais difícil…
Este clube de pesca irlandês é formado por gente incrivelmente bem disposta. Mas eles não conseguem pescar como nós, por não terem condições para isso: as águas são muito verdes… |
Mas não se esgota naquilo que já vimos o que pode prejudicar a visão dos nossos peixes no seu elemento líquido.
Um factor que interfere na nossa pesca é a redução de luminosidade provocada pelo aumento da profundidade a que pescamos.
Se em pesqueiros baixos a quantidade de luz é muito próxima daquilo que estamos a ver com os nossos olhos, já em pesqueiros fundos isso não acontece.
Lá muito em baixo, de manhã, alguns minutos depois de nós humanos já termos visibilidade suficiente para não necessitarmos de luz, ainda é noite.
E isso quer dizer que ainda temos algum espaço de tempo para poder “filar” algum peixe de bom tamanho, mesmo de uma espécie naturalmente desconfiada.
É precisamente neste período do dia em que as maiores douradas e sargos se deixam ver, em zonas de águas calmas. Sargos velhos, os tais de “dentes pretos”, com idades avançadas e sabedores de todos os truques que usamos para os enganar, são, ao raiar do dia, extremamente fáceis.
Não só os conseguimos ferrar com algumas facilidade, como temos ainda a vantagem de podermos actuar com linhas mais grossas, tentando peixes maiores.
Aqui, a lição a tirar não é necessariamente a de termos peixes a comer pela manhã bem cedo, é sim a de podermos explorar a menor quantidade de luz existente, a facilidade de os peixes mais desconfiados não conseguirem ver na plenitude as nossas linhas e montagens.
Sinto-me particularmente feliz por pescar em dias de chuva, ou dias muito nublados, por associar isso a boas memórias de grandes pescarias.
De qualquer forma, não devemos ver apenas a árvore e não ver a floresta que está por trás: aquilo em que devo focar a minha atenção não é na questão chuva, ou no facto de estar nublado, mas sim na falta de luz e no que isso significa para os peixes que eu quero pescar.
A associação de “boa pesca” a um determinado factor pode afinal não ser tudo e por isso eu convido sempre aqueles que saem comigo a tentarem raciocinar e entender o que está para além das evidências.
Neste caso, não são as nuvens, mas sim o que elas proporcionam no meio líquido: falta de luz, logo oportunidades de pesca acrescidas pelo facto de os predadores entrarem em clímax predatório.
Pescamo-los por isso, por eles estarem com um aumento exponencial de actividade, (e por força disso passarem a estar muito mais receptivos a morder o nosso isco/ amostra), e por não terem visibilidade suficiente para detectarem os nossos equipamentos.
Esta bica de 2,5 kgs, um bom peixe para a espécie em causa, foi capturada pelo meu amigo Stefano, um simpático italiano que adora pescar no nosso país, bem cedo pela manhã. |
Também as sombras podem ajudar-nos muito. Há quem tenha zonas de pesca que só são banhadas pelos raios solares muito mais tarde que outras.
Locais com escarpas rochosas, cabos, etc, podem permitir-nos pescar durante algum tempo mais sem a incidência da luz do sol directa. Isso é uma vantagem…
Um outro factor a considerar é a ressaca da onda. Quando existe, pode acontecer que a água fique leitosa, branca, com muito oxigénio (leia-se diversos gases) dissolvido.
São condições particularmente apreciadas pelos robalos para caçarem, embora deixem de o fazer à vista. Lançar aí umas linhas com amostras mais chamativas, com uma recuperação lenta, pode ser uma boa ideia.
Tentem imaginar o efeito de um pequeno popper, ou um lápis, sem pala, a ser recuperado de forma intermitente, a espaços, a tirões, numa zona de água bem oxigenada, onde os robalos se sentem como “peixe na água”.
Tudo o que lhes possa servir de zona de emboscada é potencialmente um bom spot de caça e a visibilidade reduzida à superfície favorece-os. Não esqueçam que por baixo eles conseguem ver na perfeição, as bolhas apenas existem na primeira capa de água.
Não podemos olvidar um outro factor de redução de luminosidade: a chegada da noite.
Em semanas de luas pequenas, quarto minguante e crescente, a quantidade de luz reduz bastante. Se pescamos longe das cidades, normalmente sítios bem iluminados, a noite traz com ela o escuro, o breu.
E isso abre a porta à entrada de ilustres senhores que se aproximam da costa para comer.
Este é o período em que os “lobos” descem ao vale. E sabemos que enquanto houver um lobo vivo, nenhuma ovelha pode sentir-se segura...
Nestas alturas, a ideia será a de pescarmos em zonas muito baixas, eventualmente menos de 1 metro de profundidade, com amostras luminescentes, ou até escuras, castanhas, pretas.
Em águas verdes idem, amostras escuras fazem contraste e são mais efectivas. Eles conseguem vê-las.
Vamos continuar na próxima sexta-feira...
Vítor Ganchinho
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