Temos vindo a espiolhar alguns dados morfológicos do robalo, no sentido de adquirirmos mais conhecimento, mais armas para o enfrentarmos naqueles dias difíceis em que parece nada resultar.
Quanto mais o entendermos melhor seremos capazes de o pescar.
Falava-vos no último número da famosa linha lateral, um sexto sentido que faz de nós principiantes imberbes quando comparados com as incríveis capacidades que o super profissional robalo apresenta quando se trata de procurar, detectar e capturar comida. Ou as nossas amostras…
A linha lateral também permite que o peixe evite obstáculos subaquáticos onde a água está tão tapada, turva, que a sua visão fica irremediavelmente prejudicada.
Tenho para mim que este factor entronca também numa outra capacidade, e essa sim podemos pensar que generalizada por todos os peixes, a que se chama de reotaxia positiva, a tendência que eles têm para nadar sempre contra a corrente.
Fazem-no e fazem ainda mais: conseguem seguir ao longo de uma linha de fluxo de corrente mais forte, mantendo um controle absoluto sobre o ponto em que essa corrente abranda, e lhes deixa espaço para consumirem menos energia.
Isto tem uma importância vital para quem pretende ter a mesma pressão, ou próximo disso, em ambos os lados do corpo.
Deixem-me dar-vos um exemplo de como nós próprios fazemos algo parecido quando nos sentimos incomodados com um factor ligado a fenómenos naturais: quando avançamos contra o vento forte e a chuva, nós somos capazes de posicionar o guarda-chuva no ângulo certo, aquele
em que nos molhamos menos. Inclinamos o corpo e o guarda-chuva até descobrirmos a forma de nos protegermos mais.
Os robalos, e seguramente muitos outros peixes que enfrentam as correntes, são capazes de escolher o ponto da corrente em que o fluxo começa a abrandar e o esforço para avançarem é menor.
Esta propriedade dos peixes é conhecida há milhares de anos, e em todo o mundo os pescadores têm-na usado para capturar peixes, cravando estacas no fundo do mar num ângulo em relação ao fluxo principal, de modo que a linha de fluxo mais forte acabe numa armadilha. Se recuarmos uma centena de anos, isso era feito pelos pescadores do Tejo, e muito comum nos nossos rios, para pesca de peixes bem nossos conhecidos, os barbos, as carpas e até para a pesca da lampreia.
Podemos, portanto, assumir que os peixes detectam obstáculos, detectando as mudanças de pressão na água causadas pelos obstáculos.
Uma característica muito interessante na formatação biológica do robalo é a sua capacidade de viajar de água salgada para água doce e vice-versa sem sentir particular desconforto.
Tal facto dá-lhe uma vantagem assinalável quando se trata de deixar para trás a concorrência que em águas abertas marinhas sempre teria.
Se está fora acaba por se tornar menos selectivo, porque tem a concorrência de pargos, sargos, etc, se está dentro do rio pode escolher o que lhe “apetece” comer. Não deixa de ser curioso que a maior parte dos biólogos que escreve relatórios sobre o conteúdo estomacal dos robalos refere sempre que são encontrados caranguejos.
Atrevo-me a pensar que esses, junto com os camarões, são parte importante da sua dieta quando dentro dos rios. O resto serão os inevitáveis alevins de peixes, os quais, conforme podem calcular, abundam e estão sempre disponíveis se o predador se encontra dentro de um estuário.
Por isso o robalo, porque tem essa capacidade de mudar de salinidade de águas, acaba por fazer a sua vida a entrar e sair, de acordo com as suas conveniências.
Quando pensamos no seu roteiro anual, naquilo que faz à sua vida, nos sítios que frequenta, não conseguimos imaginar que possa girar muito sem ser à volta de alimentação e reprodução.
Estes dois objectivos primários na vida do nosso robalo condicionam as sua opções e fazem-no seguir para um ou outro lado. Quando estão dentro do rio a sua coloração é mais clara no dorso, mais esverdeado no ventre, e se saem para águas abertas e estão mais fundos, a sua cor muda para cinza escuro, antracite se quiserem, e mais prata no ventre.
Quanto às amostras a utilizar, conforme foi dito no início desta série de artigos, é tão vasta que quase podemos dizer que morde tudo!
A título de conselho pessoal, penso que devem ter em conta as capacidades visuais do peixe, a sua tendência para reagir a vibrações provocadas pelas amostras e, se os pescarem em zonas muito frequentadas por outros pescadores, optarem por amostras sem pala. O trabalho não tem de ser feito exclusivamente por este acessório, esta parte da amostra, o qual de facto permite ao pescador uma recuperação linear, descansada, mas que fatiga o peixe e o torna desconfiado quando usada em excesso.
Pensem sempre que antes de chegarem ao pesqueiro pode ter estado outra pessoa a usar o mesmo tipo de amostra, e o quanto isso perturba um predador. Deixa de acreditar...
Amostras com pala usam-se quando temos de sobrepor ao barulho ambiente um objecto que queremos que seja visto ou ouvido. No meio da ressaca da onda, da espuma, das vagas, aí sim, usem amostras com pala.
Em águas calmas, paradas ou não, esse acessório é sempre dispensável.
As amostras já são em si um objecto que emite vibrações suficientes, e se houver visibilidade, as suas rotações, os seus flashes, são mais que suficientes para serem detectados.
O principal ponto a lembrar é que o robalo é um predador e, se considerarmos até outras criaturas predadoras da natureza, eles caçam principalmente por estímulos de movimento.
Em miúdo, eu pescava achigãs com alguns metros de linha de mão à qual atava um triplo, um pequeno chumbo para permitir o lançamento e um pedaço de papel de prata, (recolhido dos milhares de maços de tabaco deitados ao chão nas ruas). E era tudo.
Enchia canastas de vime com achigãs. A pesca pode e deve ser simples, o que é difícil é entendê-la enquanto actividade simples, Para o predador, o movimento é tudo!
Testem isso com o gato da vizinha: uma linha, uma bola de papel e movimento…
Não faz falta mais nada, só isso é o suficiente para pôr o gato a caçar. A bola apenas deve ter o tamanho médio de um rato, a cor é indiferente, mas tem forçosamente de ter movimento.
A experiência deve respeitar a integridade física da vizinha, …já agora.
Vítor Ganchinho
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