No mar, há momentos do ano particularmente favoráveis a encontros imediatos do 3º grau.
Refiro-me a encontros com peixes de bom tamanho, aqueles peixes enormes, pesados, disformes, os que povoam os nossos sonhos mais secretos.
Os meses de primavera trazem-nos os grandes às nossas águas, e colocam-nos bem perto da costa, por vezes ao alcance de um lançamento de terra.
Falo-vos de corredores de passagem de peixe por onde evoluem enormes tintureiras, tubarões mako, atuns, corvinas, e, para quem conhece os seus paradeiros habituais, alguns meros.
Há algo ainda maior que costuma passar nos canais de migração de peixes, mas que descartamos desta equação: as orcas. Desde logo porque não são peixes e por não pertencerem sequer ao imaginário de alguém que pesca.
Ninguém no seu perfeito juízo vai ao mar pescar orcas. E até duvido que alguém seja capaz de o fazer à linha....embora saiba que os sul africanos pescam por lá os seus tubarões brancos.
Nós ainda não chegámos a esse ponto de loucura.
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Este é o tempo de pegar no arsenal mais pesado e ir à procura de bichos grandes... |
Se por acaso alguém resolver ir por peixes grandes, a primeira coisa a fazer será sempre assumir se tem ou não capacidade física para o fazer.
Pescar cavalas é uma coisa, pescar atuns é outra. São parecidos no formato, nas cores, até nalgumas reacções, mas muito diferentes no poder atlético.
Um atum é uma besta de força, tem um arranque poderosíssimo, sustentado, pesado, e pode fazer-nos muito mal ao nosso corpo se não soubermos o que fazer.
E se a questão se coloca em termos físicos do pescador, da sua integridade física, da sua saúde, dos seus músculos e ossos, obviamente também os nossos equipamentos deverão estar preparados para a função, ou o resultado final será desastroso...
Quando menos se espera, damos por nós a ver sair vertiginosamente linha do nosso carreto, sem percebermos bem aquilo que está na outra ponta.
A sensação é sempre a mesma: “agora sim, ...ferrei um combóio da linha de Sintra”...
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Neste caso aquilo que foi à isca foi uma tintureira de peso. Não deixa de ser uma contrariedade porque obriga a trabalho físico e no fim é apenas mais um peixe para libertar. |
Os equipamentos a utilizar não são os de sempre, não são os que utilizamos para pescar “pica-pica”, porque esses não estão talhados para isso, não estão dimensionados nos seus detalhes e na sua qualidade para esse tipo de esforço.
Um carreto para douradas, para sargos, se sujeito a um esforço de torção e rotação intenso e prolongado pode....derreter!
As peças têm limites mecanicos de utilização e, se forçadas, podem aumentar de temperatura ao ponto de comprometerem toda a estrutura e mecânica do carreto. Há peças como as alças, a manivela, o drag, que podem podem pura e simplesmente ...ceder e rebentar.
Também as engrenagens podem, se violentamente forçadas, sucumbir perante o esforço, aquecer para lá dos seus limites e quebrar. Desencaixam, ...gripam, saltam!
Quanto às linhas, a mesma coisa. Na maior parte dos casos, aquilo que acontece é que as linhas mais finas, mesmo as que utilizamos para pescar pargos e afins, quando expostas a uma fricção contínua nos passadores da cana acabam por aquecer, acontecendo a rotura. A própria deslocação do peixe dentro de água, e por estranho que isto vos pareça, provoca um atrito que danifica as linhas, queima-as, normalmente ao nível das zonas de nós.
O nó será sempre um ponto fraco do sistema, e por isso não deve ser negligenciado aquando da preparação do equipamento.
Não esqueçam que vamos ter de fazer força a sério, e que as zonas dos nós irão roubar parte da resistência da nossa linha. Há mesmo fabricantes japoneses que indicam o valor de resistência da sua linha, já contando com o factor “nó e respectivo atrito”.
É o caso da Seaguar e alguns produtos da Varivas, não muitos.
Isso em Portugal não deixa de ser fatal porque a maior parte das pessoas ainda compra as linhas olhando tão só ao diâmetro e à propalada “resistência em quilos”...
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Quando temos linha um pouco mais fina, devemos ter em consideração algum eventual arranque, pelo que ter o drag aberto, no limiar do “um pouco demais”....não deixa de ser previdente. |
O dilema da escolha do equipamento persistirá sempre: para o carreto, qual a boa opção: linha de nylon grossa ou trançado forte?
Linhas de nylon são uma boa opção, mais barata, mas convém pensar que o seu maior volume obriga a uma bobine de grande dimensão. E isso significa um carreto grande, eventualmente pesado demais nas mãos para uma luta morosa, se esta for feita em stand-up.
Para quem trabalha com uma cadeira de combate, não há dúvidas: carreto desmultiplicador com 1200 metros de linha 80 libras nylon, de qualidade, de alta resistência, e resolve-se o problema. É deixar o peixe levar linha e no fim ...ele cansa-se.
Mas para quem tem um pequeno barco, não quer sair muito da costa e ainda assim quer tentar a sua sorte, a opção por um carreto preenchido com trançado acaba por se impôr. E nesse caso, um rolo de multifilamento PE 8, ou mesmo PE 10, pode ser bem mais razoável.
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Tintureira encorpada, com cerca de 2 metros para algumas dezenas largas de quilos... |
E que modelo de carreto? Pois cada um faz a opção que lhe parece mais conveniente, atendendo à técnica a utilizar. Eu, que gosto de tentar os atuns a spinning, se a possibilidade surgir (tive há dias provavelmente uma centena de atuns de grande porte à volta do barco, a uma distância de não mais de 20 metros), procuro levar nas mãos um carreto que me permita lançar em distância.
É o caso das fotos que vos mostro, em que a opção foi no sentido da utilização de um conjunto convencional, cana e carreto Daiwa Saltiga.
Se o modelo for o correcto, para pesca grossa, não nos sentimos despidos. Neste caso um carreto tamanho 8.000 equipado com um PE de boa qualidade já dá para uma boa refrega.
O dilema será sempre o do costume: um multifilamento mais grosso dá mais segurança, mas em compensação a quantidade de metros totais que cabe na bobine do carreto é menor.
Venha o diabo e escolha....possibilidade de fazer mais força, mandar mais, controlar melhor o peixe, ou ter mais metros, logo mais tempo de saída de linha, mais tempo...?...
Vejam o vídeo:
Clique na imagem para visualizar e na rodinha das definições para melhorar a qualidade.
O baixo de linha deve ser feito com nylon a partir de 1 mm de espessura, não menos. Se possível, recorrer a um fluorocarbono de 1.5 mm de diâmetro. Isso ajuda.
Não sendo as tintureiras um objectivo em si, não vale a pena aplicar cabo de aço no terminal. Caso seja, caso a intenção seja mesmo a de pescar as insalubres tintureiras, a sua utilização é obrigatória, sob pena de apenas estarmos apenas a prejudicar peixes que não precisam de “enfeites” de anzóis na sua boca.
Os seus dentes são lâminas afiadas e cortam qualquer tipo de nylon, mesmo que este seja de...2 mm.
Podemos ter a sorte (??) de a ferragem ser feita nas comissuras da boca, numa zona onde os dentes não chegam. Foi o caso.
Vamos ver dos atuns no próximo número.
Vítor Ganchinho
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Parabéns Vitor. Belo exercício para se manter em forma. Esta é a melhor preparação física que se pode ter para se manter em forma para próximos combates.
ResponderEliminarOlá, bom dia! Há trabalhos que se dispensam..... e este foi um deles.
EliminarPor tudo e mais um par de botas.
Para além de mais de 20 minutos de guerra, ainda foi um martírio retirar o anzol ao bicho de forma a deixar o peixe ir embora sem mazelas de maior.
Mas tem de se fazer, e eu tenho sempre a bordo um alicate de pontas compridas para o efeito.
As tintureiras são muito mais comuns do que as pessoas pensam, há imensas.
Como diz, serve o treino para fortalecer o braço para ...os pargos.
Abraço
Vitor