Por definição, o spinning, uma técnica de pesca com princípios assentes em lançamentos horizontais de amostras ligeiras, beneficia objectivamente de águas limpas.
Procuramos cobrir uma determinada extensão de água com uma amostra, tornando-a “viva” através dos movimentos que lhe imprimimos, ou que ela própria executa, tentando provocar o ataque dos predadores que nesse momento assomem à superfície.
Ou que evoluem um pouco abaixo dela.
Basicamente trata-se de um truque, de um engano digno de um mágico e sua cartola: induzir os peixes presentes na zona a interessarem-se pelos movimentos erráticos de algo que fugazmente se parece com o seu alimento habitual, na circunstância um pequeno peixe vivo, em dificuldades.
Os nossos robalos, os lírios, as anchovas, os peixes-agulhas, as cavalas, as sardas, os sargos alcorrazes, as bailas, são algumas das espécies que podemos esperar obter desta forma.
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Os robalos incomodam-se pouco com a visibilidade das águas, mas mudam os seus processos de caça à conta disso. |
Se temos vantagens ao escolhermos pesqueiros não demasiado profundos, por razões que se prendem com a distância a que podemos ir “levantar” peixes do fundo, (é difícil motivar um predador que se encontre a vinte ou trinta metros da superfície a vir morder uma amostra que lhe passa muito acima, longe de si, junto à linha de água), também é verdade que os pesqueiros mais baixos são muito mais sensíveis à instabilidade gerada por más condições climatéricas. Concretamente a ganhar rapidamente turbidêz.
É de visibilidade, ou da falta dela, que tratamos hoje e nos próximos dois números do blog.
Quanto mais baixos os pesqueiros mais tendência têm para sofrer com as naturais turbulências do mar.
Vamos de seguida ver porquê, quais os factores que podem prejudicar a visibilidade da água e de que forma isso pode emagrecer os nossos resultados ou mesmo impedir que consigamos pescar.
Lanço aqui alguns dados para efeito de análise:
Os ventos empurram as massas de água, movimentam-nas provocando ondas e vagas, e essa deslocação vertical levanta os sedimentos pousados sobre o fundo e coloca-os em suspensão.
As marés, fruto do efeito de gravidade solar e lunar, vazam e enchem, obrigando as águas rasas a correr vertiginosamente, originando dessa forma uma enorme instabilidade de fundos, mais uma vez levantando o poalho.
Em meses quentes, o nosso Maio / Junho/ Julho e Agosto, a temperatura da água sobe uns graus e isso propicia uma reprodução descontrolada de algas verdes, as quais roubam visibilidade ao meio aquático.
Após os primeiros temporais de Setembro/ Outubro, as ondas altas aparecem-nos fortes, a empurrar à sua frente tudo o que encontram no caminho. A sua força de fundo faz-se sentir junto das massas de plantas subaquáticas, quebrando-as, arrancando-as pela raiz, formando assim tapetes compactos, densos, que não só retiram visibilidade como podem mesmo impedir-nos de pescar.
Em zonas próximas dos grandes centros urbanos, e por força de algumas descargas de resíduos, também é normal que a visibilidade baixe.
Estuários de rios, lagoas, riachos e outras saídas frequentes de águas paradas acabam por acumular vazas, lodos. Estes locais turvam mais depressa que outras zonas situadas em acantilados rochosos, ou arenosos, longe de grandes acumulações de sedimentos finos.
A própria água pode em si ser um factor de perturbação: as descargas de barragens trazem ao mar um grande aporte de água doce. Misturam-se águas com diferentes densidades, muito mineralizadas, com muitas partículas diluídas. O resultado imediato é que a visibilidade baixa substancialmente.
Em momentos de chuva, os rios ou riachos que desaguam directamente no mar acabam por transportar o aluvião, o barro, os sedimentos minerais provenientes da erosão das terras. Zonas de predominância agrícola serão mais afectadas por este fenómeno já que as máquinas, ao revolverem as terras, soltam-nas, retiram-lhes firmeza, deixando-as à mercê da chuva forte. O passo seguinte será o seu transporte, por gravidade, até à costa.
Trabalhos humanos no mar, como o arrasto costeiro, as dragagens, etc, também eles contribuem para a formação de nuvens de suspensão.
Todos estes factores acima descritos, e muitos outros, contribuem para a existência de partículas sólidas em suspensão, as quais irão alterar mais ou menos o grau de visibilidade máxima no local onde lançamos as nossas amostras.
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A actividade humana mexe com as águas, por vezes de formas insuspeitas. A passagem de uma embarcação irá oxigenar as águas e promover uma maior reprodução de algas... |
Por experiência própria noto que as minhas taxas de capturas são bastante afetadas pela clareza óptica da água.
Por norma tenho mais sucesso se a água estiver límpida, transparente, do que quando ela está turva. Ou pior que isso, turva e cheia de sedimentos em suspensão.
Vamos excluir desta equação os momentos em que temos rolos de algas a serem arrastados para a costa, já que aí nem vale a pena tentar lançar uma amostra.
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Este é um caso que é de muito difícil resolução. A manta de algas pode estar a mais de uma centena de metros da costa... |
E perguntam: “então mas não podemos pescar em águas turvas”?
Claro que sim, claro que podemos, mas isso exige uma mudança de processos, de estratégia.
Tudo dependerá da densidade de sedimentos que existirem. A partir de um determinado ponto, é virtualmente impossível pescar.
Mas não devemos confundir turbidêz, as ditas “águas tapadas”, com águas “caldo verde”. É e será sempre uma questão de densidade, mas águas sujas podem dar para pescar.
Vejam o caso das pessoas que fazem spinning dentro dos estuários, por vezes com águas muito tapadas, e que não deixam de pescar os seus robalos e bailas.
Mas a táctica de pesca é outra, não é igual a pescar em águas claras. E porquê?
Vamos continuar com este tema no próximo número.
Vítor Ganchinho
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