Certamente alguns de vós já ouviram dizer que deixar sobre a mesa pão pousado de cabeça para baixo dá azar.
Não é apenas superstição, o conceito vem de longe, da idade média, e muito concretamente refere-se a uma prática habitual dos padeiros medievais.
Sabem que nessa altura não havia futebol e as pessoas distraiam-se com outras coisas: havia regularmente execuções públicas, por exemplo.
A essas mortes por decapitação assistia uma multidão de gente vivamente interessada no mórbido espectáculo do corte do pescoço a alguém.
Nessa altura, os padeiros sabiam que deviam guardar um pão para o carrasco, sob pena deste poder não ter forças para levantar o pesado e afiado machado com que iria separar a cabeça do corpo a um qualquer infeliz.
Para não venderem esse pão, para garantirem a “reserva”, deixavam-no virado de cabeça para baixo, em jeito de “marcação de cliente”.
Sinceramente lembro-me disso quando vejo as traineiras de pesca profissional dirigirem-se aos pesqueiros onde costumo pescar os meus pargos, os robalos, as bicas, douradas, etc.
Sítios onde vou pescar à linha, um peixe de cada vez, com uma cana, um carreto e um jig ...
As traineiras saem dos portos de madrugada bem cedo, ainda de noite cerrada, e vão directas aos sítios onde sabem que ainda existe algum peixe.
O abrandar do roncar dos motores a gasóleo anuncia que daí a alguns minutos centenas de metros de redes altas vão cair sobre os fundos. É uma morte anunciada para muitos cardumes de peixes.
Milhares de peixes.
Depois de recolhidas as redes de malha fina, não fica nada. Tudo o que estava naquele local desaparece.
Se formos distraídos e inocentes podemos acreditar que apenas cavalas e carapaus terão sido capturados. Podemos ser crentes ao ponto de acreditarmos que os predadores que se alimentam desta comedia estão tão longe do seu alimento que nunca são capturados....
Aquilo que vejo quando passo com o barco por cima dos locais recentemente pescados é uma sonda em branco, vazia de pontos. Não fica nada....
Isto tem alguma coisa a ver com ecologia?!....
Com preservação de habitats, com protecção de espécies?
Pode acontecer que este tipo de pesca venha um dia a ser considerada dizimatória e nociva ao meio ambiente?
Quem sabe se de uma opinião pública informada pode surgir uma vaga de fundo que leve a uma tomada de posição da União Europeia?
O que me parece evidente é que os recursos marinhos não são infinitos e que nunca a reprodução do peixe poderá ser tão rápida quanto o lançar e recolher de uma rede.
Até porque eles lançam, recolhem, lançam e recolhem e irão fazê-lo até encher os porões com toneladas de peixe.
E no dia seguinte lá estarão, a reclamar o seu pão virado de cabeça para baixo....a lançar de novo.
Até não haver...
Vítor Ganchinho
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