VER OU NÃO VER - QUE DIFERENÇA? - CAP III

Zonas que ofereçam uma transição de águas, como as desembocaduras de rios ou riachos, serão sempre de explorar por quem quer pescar robalos.
Poucos ambientes serão mais certos e seguros para encontrarmos estes predadores que um estuário.
Por várias razões, entre elas o facto de permitirem encontrar alimento em variedade e abundância, de fácil captura.
A lista é extensa, desde alevins de água doce que de repente se veem empurrados pela força da água para um meio que não é o seu, a água salgada, a escorrência de insectos transportados pela corrente, anelídeos, camarões, caranguejos, etc. Também conta o facto de se poderem ver livres de parasitas incómodos que não suportam a diferença de salinidades.
Outros factores haverá que favorecem a presença destes predadores, um deles a ausência de concorrência.
O facto de poderem operar indistintamente em ambas as águas,( são seres eurialinos), permite-lhes reduzir a competição pelo alimento, torna-os exclusivistas num meio onde os outros não entram.
Mas raramente a visibilidade das águas será máxima nestes pontos.

As saídas de água doce são locais de muita profusão de vida e por isso zonas privilegiadas para encontrarmos robalos. Estas, neste momento, têm águas limpas.

Já vimos anteriormente: a falta de visibilidade pode obrigar o peixe a mudar a sua estratégia alimentar.
Chegados aqui, cumpre dizer que quando um robalo muda a agulha da sua alimentação para algo diferente dos esquivos peixes miúdos, e passa por exemplo para os caranguejos ou camarões, ele enfrenta um tipo de concorrência que não o favorece. Bem mais adaptados que os robalos para comer uma minhoca, estão os sargos ou as douradas. Por exemplo.
Se em idade juvenil, com poucos centímetros de comprimento, o robalo vive sobretudo dentro dos estuários e procura avidamente os anelídeos, as pequenas minhocas e liliputianos seres que dificilmente reconheceremos como alimento, já depois de chegado à idade adulta esse é um tipo de alimentação que ele preferiria declinar.
Mas se não há visibilidade suficiente, ...pois seja.
Aquilo que estamos a analisar é uma mudança de estratégia alimentar a que se vê forçado um peixe quando a sua fonte de alimento base lhe é negada pelas condições adversas do seu meio natural.
Todos conhecemos exemplos de peixes que se alimentam em condições absolutamente extraordinárias, rios de lama, águas ácidas com cores castanho barro, lodos verdes, enfim, tudo aquilo que possa ser julgado impossível mas que afinal não o é.
Mas convém lembrar que esses peixes têm capacidades físicas que resultam de adaptações com milhares ou milhões de anos. Vamos ver isso no próximo número do blog, com exemplos de rios onde parece impossível que exista vida.


E como se adaptam por sua vez as presas, aqueles que não querem ser comidos, a situações de águas escuras, tapadas?
No caso de pequenos seres que servem ao robalo de alimento, por exemplo os camarões, ou os caranguejos, a falta de visibilidade não os afecta, não constitui em si um problema para que cumpram o seu regime alimentar diário.
Têm tempo para se aproximar e usufruir do seu alimento. Mesmo nas águas mais turvas e carregadas de algas, um caranguejo pode encontrar a sua alimentação e se não o faz em menos faz em mais tempo.
O ritmo é apenas o das marés e a fraca visibilidade um factor não limitante. Mais, ... beneficiam disso.
Tempo não é um problema para quem se pode aproximar e analisar o que come, mas tempo é fundamental para que um predador possa produzir uma detecção de presa, faça a sua aproximação, proceda a uma análise das condições de segurança, a preparação do ataque e por fim a captura.
Para tudo isto é necessário tempo. Se não há visibilidade suficiente, se o espaço em que uma presa é detectada e desaparece de vista é muito curto, tempo é precisamente aquilo que o predador não tem.
Águas tapadas são uma clara vantagem para quem procura escapar.

Tudo começa assim, com águas cristalinas, limpas. A seguir o vento muda e começa a trazer as algas...

O processo de entrada de algas ou outros tipos de arreliadores sedimentos tem muito a ver com os ventos e correntes.
Pode ser relativamente rápido, e acontecer em poucas horas. Para quem pesca apeado as alternativas nãos eram muitas, resta pegar na viatura e mudar de local.
Para quem pesca embarcado, as hipóteses de continuar a pescar existem, basta seguir a linha de algas e encontrar zonas mais limpas.
A ondulação predominante na nossa costa é o noroeste.
São os ventos de fora, oblíquos, que empurram as algas para a costa num sentido norte/sul com tendência para as fazerem arrojar à praia e às baías mais abrigadas.
Tudo pode ser pior quando temos a “sorte” de viver junto a rios com grandes estuários. Aí, uma nortada mais agressiva pode tapar as águas durante semanas.
Se algum vento nos é verdadeiramente favorável em termos de visibilidade será o leste, porque esse empurra para fora, para o largo, trazendo para a costa águas limpas das profundidades.
Mas por outro lado, águas limpas são águas sem vida, mais frias, com pouco alimento, e os peixes sofrem com elas.

A massa de algas pode ser tão densa que inviabilize por completo a nossa pesca.

Não ver é algo que limita, mas fiquem descansados que não é isso que mata os peixes.
Ninguém melhor que eles, com milhões de anos de adaptação, saberá o que fazer quando as más condições de mar turvam as águas.
Afinal de contas, eles já nascem nesse ambiente, e desde juvenis não conhecem outra forma de existência.
Por norma, as águas em Portugal continental oferecem menos visibilidade que as nossas águas insulares, Madeira ou Açores.
Enquanto que nas ilhas alguém pode reclamar de apenas ter 15 metros de visibilidade horizontal, isso dificilmente ocorre na nossa costa continental.
Junto aos nossos estuários posso mesmo afirmar que ter 15 metros de visibilidade é quase completamente impossível.
Conto pelos dedos das mãos os dias em que isso me foi dado a ver à saída do Estuário do Sado, onde normalmente me movimento e tenho ...milhares de saídas de mar.


Todavia, nem muito ao mar nem muito à terra.
Se condições draconianas de visibilidade, as lamas, as mantas de algas, podem prejudicar, também o excesso de visibilidade pode não ajudar à captura dos pequenos peixes que, com espaço limpo em seu redor, podem observar as tentativas de aproximação de quem os quer comer. Para quem caça, será sempre uma questão de encontrar o meio termo certo, o ponto em que as suas capacidades físicas será maximizado.
Assim sendo, aquilo que um predador de uma determinada espécie pode conseguir fazer numa dada latitude, pode não ser possível numa outra.
Desta forma, é também natural que as presas procuradas sejam diferentes, consoante as condições de visibilidade assim os predadores podem ter de deslocar-se mais para sul ou norte. Ou pura e simplesmente prefiram mudar a sua dieta alimentar.
E isso já tem impacto na nossa forma de pescar e no tipo de amostra que utilizamos...
Podemos ainda pensar que segundo as estações do ano, assim os peixes são obrigados a migrar mais para aqui ou ali, já que as grandes tempestades turvam mais as águas e tornam as condições mais difíceis.
A movimentação dos peixes é feita não de acordo com as suas preferências, mas de acordo com as limitações que lhes são apresentadas nesse momento pelo seu meio ambiente.

Vamos terminar no próximo número do blog esta sequência de três artigos.
Mais que tudo gostaria que fizessem uma reflexão acerca deste tema, que estas breves linhas vos façam pensar.
A pesca faz-se e pensa-se, não necessariamente por esta ordem.

Boas pescas!


Vítor Ganchinho


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