Quando uma força é aplicada sobre o meio líquido gera-se uma deslocação de massa, uma turbulência. Algo se move, irradiando aquilo a que podemos chamar de “ondas de pressão”.
Como a água é muito mais densa que o ar em que nos movimentamos, propaga essas ondas de pressão de forma bem definida, com muita precisão.
É possível, a quem está equipado com sensores próprios, identificar com muita certeza o quê, onde, como, e com algum grau de certeza, quem emitiu esse factor de instabilidade.
O sexto "sentido" da linha lateral detecta e interpreta essas ondas de pressão, o que permite aos peixes a tomada de consciência sobre vibrações de baixas frequências.
Falo-vos das ondas/ vibrações geradas por um ligeiro batimento de cauda, de uma boca que morde, uma branquia que abre e fecha ou qualquer outro tipo de movimento relativamente próximo.
Bem sei que isto vos parece estranho, mas estranha é a natureza e os limites a que ela pode chegar em termos de perfeição!!
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O tema é “linha lateral”. Aqui têm uma, do opérculo à cauda, bem marcada por fazer uma separação de cores, neste pargo que capturei em Sines. |
Os peixes conseguem detectar essas vibrações de forma clara e por isso não se espantem pois por eles sentirem facilmente a queda de uma amostra na superfície da água.
Claro que sabem onde bateu, o seu peso, e até para onde vai! Tem a ver com um grau de sensibilidade que nos é estranho, mas existe.
A melhor descrição que li sobre como esta coisa funciona é: "para entender a detecção de movimento relativo pela percepção de ondas de pressão, devemos mover a nossa mão lentamente em direção ao topo de uma mesa, sem tocá-la completamente.
Se o ar fosse denso o suficiente e a nossa mão sensível o suficiente, poderíamos sentir a pressão do ar mais alta acima da mesa em relação à pressão mais baixa na borda, por onde o ar poderia fluir.
Nós conseguimos pensar e por isso é-nos possível imaginar o que será um grau de sensibilidade extremo, em que a mão sente o ar mais denso, mais comprimido, na parte da mão que assenta sobre a mesa.
E por consequência também deveria sentir o ar menos denso, menos comprimido, na parte da mão que baixa do lado de fora da mesa, por onde o ar empurrado pela mão pode escapar sem limitações.
A questão é que, sendo as nossas mãos um ponto ímpar de sensibilidade humana, ainda assim não somos capazes de chegar a esse ponto de perfeição. Está muito para lá das nossas capacidades!
Da mesma forma que a nossa visão não consegue ver mais longe que uma águia, ou que não podemos cheirar ínfimas partículas como um cão rafeiro faz. Não somos capazes...
A linha lateral dos peixes tem essa sensibilidade!
Ela funciona nos peixes a esse nível e por isso é chamada de "toque à distância". É assombroso!
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Este foi pescado num dia de muita corrente, com um jig em formato de agulha, um Little Jack de 40 gr. |
Portadores de um cérebro de alto volume, (a média do volume cerebral das mulheres é de cerca de 1.130 cc e o dos homens é de 1.260 cc....), somos capazes de ser melhores em alguma coisa.
E provavelmente seremos até capazes de encontrar falhas no sistema deles....tanto assim que os pescamos.
Enquanto espécie dominante não devemos porém deixar de admirar quem sabe fazer algo melhor.
Eles sabem.
Mas também têm as suas limitações.
Para que o sentido da linha lateral funcione, o peixe, o objeto que ele está detectando, ou ambos, devem estar em movimento.
Evidências experimentais sugerem que o sentido da linha lateral pode ser bastante preciso na detecção de objetos relativamente pequenos, ínfimos, porém para essas minudências é eficaz apenas a curta distância.
Porventura não será necessário mais, ou a adaptação natural poderia ocorrer, mas não é isso que se verifica.
Mas que é isso de linha lateral, então?! Vamos ver já de seguida no próximo número do blog o que é e a mecânica que lhe está associada.
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Nesta boca cabem todos os anzóis que resolvermos utilizar. Assim queira morder... O que determina a vontade de atacar uma amostra? |
Esta é uma sequência de alguns artigos técnicos.
Bem sei que é bem mais fácil e rápido olhar para uma foto e ler um comentário sobre baldes de peixes, mas aquilo que se aprende com isso é zero.
Neste caso, vamos ver de que forma os neuromastos subcutâneos dão a informação ao peixe de que caiu uma amostra na água....
Neuromasto é o nome dado ao receptor do sistema da linha lateral de um peixe.
É uma estrutura situada por baixo da epiderme, algo similar ao ouvido interno dos vertebrados e permite ao animal perceber vibrações, variações de temperatura, ondas de choque e certos parâmetros químicos na água, fornecendo-lhe informações cruciais para a sua sobrevivência.
Consiste numa cúpula flexível e gelatinosa, apoiada sobre uma massa de células sensoriais, as quais possuem vasos nervosos incrustados. Isso pode ver-se na imagem abaixo.
A linha lateral tem como princípio base o facto de estar em contacto com a água e poder receber informação que chega do exterior.
Uma onda de pressão na água faz com que a cúpula se mova e os nervos transmitam a direção e a extensão do movimento para as células sensoriais.
Por sua vez, estas geram então impulsos nervosos de reacção e se necessário, o cérebro dá ordem de resposta: ataque, passividade ou fuga.
A importância dos neuromastos, localizados sob a pele, nas fossas nasais ou em canais que correm ao longo do corpo do peixe é muito maior que a de um conjunto de sensores de automóvel que nos permitem estacionar sem bater. É muito mais que isso já que se trata de um equipamento, (são células sensoriais com cílios que detectam vibrações e enviam essa informação ao cérebro), absolutamente vital para a sobrevivência do peixe.
Surpreendentemente, o sistema da linha lateral também permite que um peixe detecte um objeto imóvel pelo movimento da água desviada por esse objeto.
Chamemos-lhes apenas ...”sensores”, mas são muito mais que isso.
O peixe desloca-se, e sente na pele essa sua deslocação. Mas para além disso, necessita também de sentir as deslocações de tudo o que está à sua volta.
Existem assim dois tipos de neuromastos, cada um receptivo a diferentes oscilações de frequência.
Os neuromastos do canal, a dita linha lateral, são mais sensíveis na faixa de frequência mais alta, de 20 a 100/200 Hertz.
Os neuromastos livres são mais sensíveis a oscilações com muito baixa frequência, de 2 a 15 Hz.
À medida que a água em movimento pressiona as paredes laterais da pele do peixe, impulsos nervosos das células sensoriais ciliadas dentro dessa linha permitem ao peixe perceber a sua posição e sentido de movimento.
As zonas de sensibilidade da linha lateral e dos órgãos auditivos coincidem parcialmente, no entanto, a diferença básica entre a linha lateral e os sistemas auditivos é que a linha lateral responde a ondas de deslocamento, enquanto os receptores auditivos respondem a ondas de pressão.
Existem ainda as ondas de pressão sonora, o som subaquático, mas essas não podem ser decifradas pela linha lateral, é trabalho para o ouvido interno.
Continuamos no próximo número do blog.
Vítor Ganchinho
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