AMAZÓNIA: MANTER O SENTIDO DE ORIENTAÇÃO - CAP V

É estranho falar de orientação na Amazónia.
Conforme vos disse anteriormente este estado tem uma área de cerca de 1550 milhões de quilómetros quadrados. Um absurdo de grande!
Para um português isso é algo inimaginável, destituído de sentido, somos tão pequenos que não conseguimos percepcionar essa grandeza.
Os rios são aparentemente todos iguais, a mata é toda igual, o mesmo tipo de vegetação, e como se não bastasse, é tudo absolutamente labiríntico.
No meio disso os guias, sempre gente da região, penetram pelos canais e acabam sempre por encontrar uma saída.
Impera um critério válido para toda a gente: no caso de alguém se perder, nunca entrar na mata! Aí, a morte é certa e rápida.

É fácil perceber que a única via é mesmo a navegação, ainda que seja feita em cima de um tronco...

Vejam o aspecto dos rios, (linhas de água, corredores...) onde se pesca. Aparentemente é um labirinto infinito, embora para os experientes guias não seja assim: 

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E agora vejam como se ultrapassam os troços menos bons:


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Tudo menos entrar na mata!
As onças, as cobras anacondas, os jacarés, as piranhas, as cobras sucuris, toda essa gente trata de quem é suficientemente crente em Deus.
A solução passa por encontrar alguns troncos, atar com raízes e ervas e deixar-se ir na corrente.
Ao fim de alguns dias a improvisada jangada irá ter de passar junto de algum povoado a sul. Pode beber-se água do rio Negro, a disenteria é certa mas quando a questão é sobreviver ou não, isso é o que menos importa.
É perfeitamente possível aguentar alguns dias sem comer, mas não sem ingerir líquidos. Pois seja, o que não falta é água...meio ácida.
A cor da água é de um castanho estranho, o que nem é mau de todo: a propagação de mosquitos é dessa forma meio inibida, embora em termos de insectos a conversa seja outra. Irei falar-vos disso num dos próximos números.


A quantidade de pescadores que se cruzam nos barcos de pesca é excessiva, e estas pessoas chegam para o mesmo: lançar amostras.
No fim, e para piorar tudo, nas cidades mais próximas proliferam as casas de pesca que se especializaram na venda de produtos de pesca destinados a esta espécie. Nada ajuda.
Os guias de pesca fazem o que podem, levam as centenas de pescadores aos locais onde alguém já pescou um peixe bom. Conhecem os labirintos das matas como ninguém, mas não fazem milagres, os locais que julgamos virgens foram pescados…ontem.
Resultado final: peixes que se esquivam, que se refugiam nos matagais onde uma amostra não entra.

As paisagens são de cortar a respiração. Vou apresentar-vos muitas mais até ao fim desta série.

Assim, por cada peixe capturado são feitos centenas de lançamentos, num esforço físico desumano.
O corpo estala, revolta-se, protesta com as poucas forças que lhe restam mas a alternativa é não pescar, e por isso continua a ir e a lançar amostras.
Lançamos até à exaustão.
Um dos meus colegas estimou uma média de 1500 lançamentos de amostra por dia.


No filme Casablanca, Humphrey Bogart imortalizou uma frase: “Play it again, Sam…”.
É um clássico do cinema porventura ainda mais conhecido que o cruzar de pernas da Sharon Stone no filme “Instinto fatal”.
Pedir ao pianista para tocar de novo a mesma música é algo que nós pescadores fazemos muito:  pescamos um peixe e lançamos de novo. Queremos viver uma vez mais a experiência de ferrar outro, lutar, voltar a recolher linha, ter de novo uma luta boa. E lançar de novo. 

Haja peixe, por pouco que seja.


Vítor Ganchinho


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