AMAZÓNIA - TUCUNARÉ, MUITO MAIS DO QUE UM PEIXE... - CAP III

A dimensão do Estado de Manaus é um perfeito absurdo: a ser um país, seria o 16 maior do mundo….algo como 1550 milhões de quilómetros quadrados.

Não é difícil morrer ali de forma incógnita.

É ali, algures, perdidos no verde, que vamos pescar durante duas semanas.

Acordar muito cedo para estar no local de pesca ao raiar do dia, tentar perceber o peixe, se para esse dia existe algum padrão de comportamento definido, estar atento às condições de tempo, ao vento se o houver, à temperatura da água, etc.

Estamos ali prontos para tudo, para sofrer se necessário, por um peixe.

No fundo, a dar o corpo ao que vier.

Tudo por um peixe colorido.

Um peixe que parece saído de um atelier de pintura, tal a sua beleza. Ficamos com os olhos pintados de cor de cada vez que pescamos um.

É verdade que o olhar de alguém que está preso também tem cores: vê o sol dourado por entre o prateado metálico das grades de aço. Mas não é a mesma coisa...ali a sensação de liberdade não tem limites. 

E quem é este tal de tucunaré?!

É um peixe da família dos ciclídeos, pertence a uma família com quinze membros com sotaque brasileiro. Acho esta espécie, em qualquer das suas subespécies, um peixe lindo.

Pesquei três delas no Amazónia e fiquei impressionado com a beleza de cada uma. Apresento-vos os bichos:

Cichla temensis, ou “açu”, com lindas riscas verticais :

Cichla orinensis, ou “ borboleta”, com três anéis e um océlo na cauda:

Um outro, o tucunaré “Paca”, de cor castanha e pintas dispostas horizontalmente, acredita-se que seja um estádio intermédio do temensis, uma evolução de cores que corresponde à passagem de juvenil a adulto.

Todavia isso é algo não provado já que se capturam peixes “paca” com dimensões consideráveis.

Por outro lado, não se pescam os “açus” de pequena dimensão...

Durante o período em que as águas do Rio Negro estão altas, é virtualmente impossível pescar bons tucunarés. Este rio é um dos muitos afluentes do Amazonas, até ver a maior bacia de água do mundo, e isso diz bem da quantidade de água envolvida.

Mas quando baixam, quando chega o período de seca, os peixes deslocam-se para poços mais fundos, para os rios que mantêm o caudal, ou mesmo lagoas permanentes.

Para chegar a essas lagoas por vezes é necessário arrastar o barco por mais de uma centena de metros. Sofrer agruras na mata, transpirar debaixo do sol escaldante, tudo isso se suporta por um “up-80”, um peixe acima dos 80 cm.

Esse momento de seca e águas baixas é o período de pesca deste peixe.

Vejam o filme:

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Lançar e lançar, centenas de vezes sem conta, sem desistir. Por cada peixe um horror de lançamentos sem fim, para cima de estruturas que são, na sua quase generalidade, verdadeiros paraísos para peixes predadores.

Um peixe não poderia desenhar para si próprio um habitat melhor.

É de tal forma intrincado o labirinto de troncos que a única forma de os desalojar é mesmo esperar que as águas desçam.

Nessa altura, à força, eles saem para o rio, para o caudal normal. Aquilo a que os pescadores brasileiros mais veteranos chamam de “ter o rio dentro da caixa”.

Aqui é possível ver a margem. Quer dizer que o rio baixou o suficiente para isso.

A sua agressividade é proverbial, conhecida no meio, e leva-o a atacar amostras com um ímpeto que nos deixa sem ar nos pulmões.

Uma picada repentina deste peixe é um choque eléctrico, uma violência, uma brutalidade que, para quem não tem um coração forte, não deve ser subestimada.

Em certas situações, se a pessoa se encontra …distraída, é algo que pode ser a antecâmara de uma violenta paragem cardíaca.

Imaginem um repentino ataque de um peixe destes com 10 kgs de peso…a uma amostra de superfície. Arrasa!

Vamos continuar no próximo número.

Vítor Ganchinho

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