SOBRE AS CORES DAS AMOSTRAS

Antes de mais, vamos ser honestos: as amostras por nós adquiridas são escolhidas por meras questões de gosto pessoal.
Temos um palpite e isso basta-nos. Pescamos com a que mais gostamos, aquela que achamos mais bonita.
E isso é pouco recomendável quando falamos de seres que vivem abaixo do nível do nosso barco…..
A opção de compra desta ou daquela amostra deve obedecer a muitos outros critérios, e nenhum deles passa por ser…bonita.

A maior parte das pessoas tem uma caixa cheia de amostras em casa, que comprou por impulso, ou porque ouviu dizer que…, ou porque simplesmente quer ter uma gama ampla de escolha.
Mas isso pode ser apenas o avolumar do problema: desde logo porque se gasta dinheiro, e a seguir porque quando chega o momento de pescar, de pendurar uma amostra, …não sabe qual escolher.
Não ter mais que uma é horrível, é estar “pendurado” porque o nível de opções reduz a zero, é aquela e não há outra. Mas ter muitas e não saber o que fazer com elas pode ser ainda pior. É olhar para a caixa, olhar para o mar e …não ver nada.
Hoje, aqui no blog, tratamos de amostras e suas cores.

A percepção que temos da pesca e das suas técnicas é algo muito pessoal, muito assente na nossa própria lógica, naquilo em que acreditamos. O que de resto não traz nada de mal ao mundo, bem pior seria pescarmos sem acreditar.
Mas na verdade, ao irmos à pesca uma e outra vez, e ao aprendermos com os nossos erros próprios, vamos evoluindo. Eu serei muito melhor pescador hoje que há 40 anos atrás. Pena que quando já sabemos algo mais, o corpo entre em declínio e por vezes já nos falte um pouco da energia e entusiasmo que tínhamos enquanto jovens. Mas adiante, porque o tema é bom: as cores, como escolher.
Deve assumir-se que, dentro de uma enorme panóplia de amostras, formatos, cores tamanhos e pesos, de tudo aquilo que podemos encontrar dentro da nossa caixa de “esperanças”, nem tudo corresponde ao que será a escolha natural do peixe que queremos pescar.
Logo por azar dos Távoras, a escolha que verdadeiramente interessa nem é a nossa! É a deles….


Este pargo entrou a um jig de cor natural sardinha. Na circunstância aqui apliquei um assiste curto, da Daiwa, algo que faço frequentemente por pescar em zonas com muito encalhe na rocha. Quanto maiores os assistes mais jigs se perdem...


Aquilo que mais nos ensina é a soma de alguns dias bons, a pescar com esta cor, mas também a resma, a palete de dias maus, a pescar com aquela cor. Acabamos por chegar lá ao fim de milhares de tentativas, de muitas derrotas e felizmente …de algumas vitórias.
O que é deveras importante é a reacção que os nossos peixes terão à passagem de uma amostra, que não pegam, e de uma outra, que mordem. E começamos a aprender. Esta tonalidade não, esta outra sim.
A mesma coisa acontece com as dimensões da amostra. Essa será mais uma questão relacionada com o tamanho das presas que o predador poderá encontrar regularmente nesse local. E também daquilo que existe nesse habitat.
Eu, que pesco de tudo e em todo o lado, já utilizei como isco um peixe de 11 kgs, e consegui ferrar um tubarão tigre de 236 kgs. Mas também pesco com um jig de 3 gr, consigo alguns carapaus, e fico feliz com isso.
Tudo é relativo, sendo que, a nível de amostras, o tamanho é algo que está por provar que seja assim tão decisivo. Quanto à cor, não há dúvidas de que os peixes reagem mais a uma tonalidade que a outra.
Seguramente que isso obedece a critérios que têm a ver com reflexos visuais, com estímulos de percepção do peixe que, ou ataca ou não. Há um impulso, um instinto alimentar que pode desencadear um ataque, ou não.
E se queremos estar do lado certo, se queremos acertar com a cor certa, então teremos de obedecer a alguns critérios:

1- A cor das amostras que vemos nas lojas, não é a mesma cor que os nossos peixes irão ver debaixo de água. Pensem nisto: nós olhámos as amostras debaixo de uma luz artificial, os peixes irão vê-la sob a luz do sol, quantas vezes ao crepusculo, e depois de transformada pela quantidade de sedimentos que essa água pode albergar. Não é igual.

2- Devemos colocar-nos sempre do outro lado da linha. Se invertermos os papéis, se estivermos do lado em que a amostra cai, vamos ver se o nível de confiança se mantém, se ainda acreditamos que a nossa amostra é mesmo um peixe vivo igual ao que comemos há alguns minutos atrás. Bate certo?! Estamos a morder o mesmo peixe? Ou será que aquilo que está ali tem outro tamanho, outra forma de nadar, outro tipo de vibrações, …outro tipo de cor?

3- A época do ano. De Verão, temos muito mais fitoplacton em suspensão que de Inverno. Com águas azuis, límpidas, porque a suspensão assentou, os peixes veem as nossas amostras de forma diferente, e a uma distância bastante superior. Por isso utilizamos cores mais naturais, mais próximas do que seria expectável o nosso predador conseguir encontrar no seu habitat natural.

4- Aquilo que muitas vezes, e sobretudo no Verão, com águas verdes, procuramos fazer, é uma mistura entre o que será possível “mostrar” ao peixe, uma amostra mais garrida, mais flash, mais visível, e aquilo que seria o ideal, um peixinho discreto com o ventre branco e o dorso castanho, azul ou verde escuro. Sabemos como são as presas naturais, sabemos que existem, mas se lançarmos algo assim em águas turvas, corremos o risco de essa peça não ser vista. Mas se lançarmos uma amostra Marlboro, ou seja, cabeça vermelha e corpo branco, ….conseguimos toques. Porque é vista! Todavia, sabemos que não há nenhum peixe vivo que tenha aquelas cores.

5- Temos pois que há um momento em que a melhor solução passa por encontrarmos um meio termo entre aquilo que seria a melhor cor visual, o tal clone do peixe forragem perfeito, cores naturais, e a outra cor, a visível, atendendo às condições da água. Aqui já estamos a diferenciar duas realidades distintas.

6- Podemos ainda complicar isto um pouco mais: Quando largamos para o fundo um Sabiki, uma montagem de penas de cores variadas, por exemplo para pescarmos cavalas para isca, aquilo que estamos a fazer é algo de diferente, que nada tem a ver com cores. As penas podem ser azuis ou laranjas, rosas ou brancas, amarelas ou pretas. E no entanto, quando chega ao fundo, em 5 anzóis pegam 5 cavalas, ou carapaus, e vem para cima. Se as cores são indiferentes e seguramente não correspondem à cor natural de qualquer presa existente no fundo, então o que mudou? Estamos a tratar de um outro factor, que se chama concorrência. Em cardumes compactos, o tempo de reacção a um estimulo alimentar tem de ser imediato, sob pena de esse peixe que tem a possibilidade de comer, ficar para trás, ultrapassado por outro que foi mais rápido. O tempo é ali o factor chave. Infelizmente, não é quase nunca esse o critério de ataque dos nossos robalos. Antes fosse.

7- Vejamos agora um outro factor que me parece importante: quando lançamos uma amostra, ou largamos um vinil ou um jig, para o fundo, sabemos que os raios solares irão permitir a sua visualização, pelo menos até um certo ponto. Depende sempre da visibilidade da água. Mas assumindo que é Outono ou Inverno, teremos grandes probabilidades de ter água azul. Nessas condições, é importante saber que as últimas cores visiveis no espectro de cores, serão o verde e o azul. Esta última, será a derradeira chance de termos uma picada. Quando o azul desaparece, já não estamos a pescar, estamos mesmo a dar banho ao jig, porque já passámos a zona fótica, o patamar máximo onde ele pode ser visto. A partir daí, é o escuro, o breu. Pegando neste assunto, sabemos que de pouco adianta querer estimular um peixe a morder uma amostra vermelha, quando o vermelho é uma cor que desaparece ao fim de …10 metros de profundidade. Todavia, é uma cor muito válida quando utilizada à superfície. Logo, a profundidade a que pescamos também é relevante.

8- Olhando às cores mais comuns nos peixes comedia, aqueles que formam a habitual escolha dos nossos predadores, temos que as cores metalizadas no flanco, o brilho metálico, estão presentes em quase todos eles. O branco no ventre é algo de quase universal. E também não é difícil assumir que todos eles procuram que o seu dorso se confunda com o fundo em que se movimentam, que oscila entre cores castanhas ou verdes. Desta forma simples, podemos começar a desenhar, a construir a nossa amostra, o nosso jig. E porquê estas cores e não outras? Pensando mais uma vez naquilo que é a evolução das espécies, no seu processo de optimização e vontade de garantir a sobrevivência, temos que o branco ventral não é mais do que a cor que melhor se confunde com o branco do sol que penetra na água. Visto de baixo, um peixe branco é mais um pouco de branco na imensidão que é o branco do sol. Visto de cima, o dorso escuro vai de encontro ao que passa mais discretamente por ser o fundo escuro das pedras. Não será por acaso que a quase totalidade dos peixes obedece a este critério: branco em baixo, escuro em cima. Os flancos brilhantes também têm uma razão de ser, e quem mergulha pode confirmá-lo: tentem olhar para um peixe estando este na direção do sol. O brilho dos raios solares não nos deixa ver esse peixe. Por isso mesmo, devemos procurar pescar e posicionar o barco numa posição que não deixe o sol nas nossas costas. Com isso, estaremos dificultando a vida ao peixe que queremos pescar, “escondendo-lhe” a nossa amostra.

9- Assumimos pois que, de uma paleta de cores disponíveis, e se queremos que os nossos peixes vejam aquilo que queremos que mordam, há que levar em conta a quantidade de suspensão da água, a hora do dia pois isso influencia a incidência do sol e por consequência a reflexão das cores da nossa amostra, (a mesma amostra pode ser entendida como cinzenta ou laranja, de acordo com as condições de visibilidade da água e a hora do dia..!), e assim sendo, chegamos à conclusão que cores claras, amarelos, brancos, laranjas, rosas, devem ser utilizados em condições de extrema dificuldade visual, tais como os dias que se seguem a um temporal, uma altura em que houve ondas altas que levantaram muita suspensão do fundo, largada de águas barrentas de barragens em zonas fluviais, etc, e as cores naturais, essas deixamo-las para os dias perfeitos, em que a água está limpa, clara, e em que o peixe consegue detectar o nosso artificial a longa distância.


Aqui um jig diferente, modelo Maria, da Yamashita, em 25 gr. Já fiz muitas dezenas de robalos com esta peça. No fim de tudo, e já meio roída e com falta de tinta por força do desgaste provocado pelos dentes dos robalos, continua a pescar. Vejam os dados técnicos abaixo.



A metodologia de escolha tem sempre a ver com a percepção que temos do mar, quer relativamente à suspensão existente, quer a hora do dia a que pescamos. Podemos deixar cair a nossa amostra/ jig para o fundo, e tentar entender por quanto tempo ela se mantém visível. Mas nunca esqueçam que isso pode ajudar a entender algo, mas também pode induzir-nos em erro, porque por vezes temos águas tapadas à superfície, e muito limpas em baixo. Mas já é um indicador, ainda assim.

Resumindo, temos pois que o meio aquático não restitui aos peixes que queremos pescar exactamente as cores que vimos nas prateleiras das lojas onde compramos as nossas amostras. Tudo o que é vermelho, desaparece ao fim de 10 metros, logo essa não deve ser a opção para pescas mais profundas.
A mesma lógica se aplica a todas as outras cores quentes, que não passam nunca os 50 metros de fundo. A partir daí, ficam apenas as cores frias, sendo o verde e por fim o azul, as últimas a desaparecer. Quanto mais suspensão mais a visibilidade será afectada, e se somarmos a isso um início de pesca logo ao alvorecer do dia, ou ao pôr-do-sol, então aquilo que estamos a pedir aos nossos peixes é demasiado, é que tenham olhos de águia, num meio líquido em que as águias mandam muito pouco.

Entendido?



Vítor Ganchinho



4 Comentários

  1. Bom dia Vítor,

    Como está?

    Mais um post com muita e excelente informação.
    Qual ou quais os factores prodominantes, que são responsáveis na questão de existir água turva à superfície e limpa mais abaixo na coluna de água?

    Abraço,
    A. Duarte

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    1. Olá António A questão que coloca é pertinente. Já aqui falámos de termoclinas, ou seja, de faixas de água com diferentes temperaturas. E também já falámos sobre a formação de algas, a qual basicamente tem a ver com a quantidade de luz e a temperatura da água. Há alturas do ano, sobretudo no Verão, em que esta massa verde se multiplica imenso, por encontrar as condições ideais para isso. Não vem mal ao mundo por aí, os peixes enfrentam estas diferenças de visibilidade com muita segurança. Passam de uma situação em que a visão é o sentido mais utilizado, para uma predominância de utilização de outros sentidos, em que a linha lateral passa a comandar.
      E porque temos então águas com diferentes graus de visibilidade? Tem a ver com as diferentes densidades, diferentes graus de salinidade. A água mais densa fica por baixo, e a menos densa, por oposição, ocupa os patamares acima. Isso acontece todos os dias debaixo do seu nariz, sem que se aperceba: A entrada da enchente no Sado, traz água salgada limpa, de fora, e essa água, tendo temperatura e densidade diferentes, ajusta-se em função disso. Ou seja, fica por baixo, fazendo com que a água "suja" que o António vê quando sai ao mar seja apenas uma capa. Por baixo está limpa. É aí que os golfinhos encontram os chocos. Eu tive curiosidade e fiz mergulhos em diferentes estados de maré, e digo-lhe que, quando temos na zona da Soltroia água muito azul, na enchente podemos chegar a ter 15 metros de visibilidade horizontal dentro do rio. Invariavelmente a temperatura das águas é diferente. O que acontece é que mergulhamos em água com menos de meio metro de visibilidade, águas de aluvião, mais doce, descemos 5 ou 6 metros e de repente faz-se dia: fica tudo muito claro. O fundo tem uma infinidade de vida que nem imagina.


      Recebeu os catálogos que lhe enviei da Daiwa e da Shimano por mail?


      Abraço
      Vitor

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  2. Boa noite Vítor,

    Não recebi os catálogos que refere, troquei de telemóvel há uma semana atrás e durante o processo de migração de informação entre aparelhos, pode ter se perdido o seu e-mail, pode por favor enviar novamente?

    Abraço
    A. Duarte

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    1. Bom dia António


      Vamos ver se por aqui consegue ver:


      Daiwa catalog URL:
      DAIWA : カタログ(デジタルカタログ・カタログお申し込み) - Web site

      SHIMANO catalog URL:
      SHIMANO デジタルカタログ|製品情報|シマノ -SHIMANO-


      Abraço
      Vitor

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