ENCONTRAR ROBALOS EM SÍTIOS INESPERADOS...

Podemos descobrir robalos em locais francamente pobres de condições.
Eu já os pesquei em riachos que desaguam no mar, cursos de água doce que em nada destoam de um vulgar afluente de rio, com as margens cobertas de ervas altas, com uma largura de pouco mais de 3 metros.
É um perfeito absurdo que esteja ali um peixe que é um dos mais emblemáticos do nosso Atlântico.
Já aqui apresentei uma foto de um robalo capturado acidentalmente por um cidadão australiano, (um turista a pescar achigãs), a 80 km da foz do Guadiana. Não deixa de ser estranho.
Para nós, o robalo é um peixe de águas batidas, que caça na corrente, sem medo de estar bem encostado ao reboliço, junto à ressaca da onda.
É essa a imagem que nos fica, a de um peixe que vai a sítios impossíveis morder numa amostra. Esses locais ficam gravados no nosso subconsciente como “bons para robalos” precisamente porque o nosso robalo é dos poucos que arrisca ir onde o mar bate forte na rocha.




A sua genética de peixe eurialino permite-lhe entrar nos estuários, e subir até onde encontre presas em tamanho e número suficientes.
Este processo já aqui foi objecto de estudo, pelo que não irei voltar a ele, mas fica o registo de uma capacidade de tolerância a diferentes níveis de salinidade acima do normal.
Pois estou em crer que o robalo ganhou a sua aura de “peixe difícil” precisamente porque uns dias está, outros nem tanto.
Procuramos por ele e finalmente encontramos uma concentração interessante, pescamos uns peixes, e passado um dia, …nada, já estará noutro lado qualquer.
A sua característica mais vincada será a inconstância, a sua aura de “desaparecido”. Não será por acaso.
Custa-nos a nós, pescadores de linha, que assim seja, mas há muito boas razões para isso.
Os predadores são obrigados a seguir as suas presas, a estar sempre por perto delas. Seguem a comida, porque precisam. E as suas vitimas são obrigadas a circular, a procurar zonas livres de predadores, onde possam alimentar-se, reproduzir, ter algum descanso. Ou seja, a estar longe dos robalos.
No fundo, está tudo ligado. Uns movem-se para estar longe, os predadores seguem-nos e por isso mudam de localização. Esta “basculação” de peixes acontece ao longo da costa e deixa-nos a nós confusos, estupefactos, por termos a tendência para encarar as situações com um carácter definitivo. Se não há peixe hoje, nunca haverá. Ou pior que isso, se hoje há peixe, haverá sempre.
Não é assim. O peixe move-se.


Estas são as vitimas mais habituais, os pequenos peixes, aqueles que as nossas amostras tentam imitar.


Já aqui vos chamei muitas vezes a atenção para um factor que determina a presença, ou não, de peixe numa determinada zona: a temperatura ambiente.
Sabemos que a água do mar consegue manter níveis estáveis durante mais tempo que o ar. Mas muda.
Na sequência de uma serie de dias de nortada forte, a água fica mais fria, pelo menos na sua capa mais superficial. Isso obriga uma infinidade de seres vivos a mudar a sua localização.
É toda uma massa biológica que se vê forçada a alterar os seus hábitos e a procurar protecção noutro lado qualquer. E se há mudanças nos micro-organismos de tamanho mais ínfimo, zooplâncton, todos aqueles que dele dependem são obrigados a mudar. Os peixinhos que veem na foto acima, seguem o seu alimento. E os robalos seguem estes, por sua vez.
O que quer dizer que a dada altura, não haverá peixes onde habitualmente os encontramos.
Não vale a pena pensar que nesse dia os robalos estão “em-dia-não”, ….o que acontece é que eles não estão lá.
Grandes massas biológicas são forçadas a migrações lentas, para sul ou para norte, de acordo com a época do ano, Primavera, Verão e Outono.
De Inverno, muito peixe entra nos rios, procurando refúgio das intempéries, normalmente peixe miúdo.
Outro, já adulto e mais encorpado, faz deslocações verticais, afundando algumas dezenas de metros. É esse o tempo de encontrarmos pargos a 150 metros de fundo.
Separamos pois as grandes deslocações de peixes em dois vectores diferentes: as provocadas por condições persistentes, as estações do ano, e aquelas que são pontuais, motivadas por condições climatéricas adversas, localizadas, de poucos dias. Os ventos frios provocam isto, e nós humanos desvalorizamos por completo. Mas notamos a ausência de ataques do peixe.
Somos sensíveis ao efeito final, mas não ao que o motiva.




Quando há deslocações de peixes, pode acontecer que pontualmente sejam encontrados robalos em zonas que seriam menos previsíveis.
Aqueles que os pescam em exclusivo, estarão mais próximo de conseguir entender o quanto é importante procurar em locais menos expectáveis.
Se há alteração das condições de pressão atmosférica, se por qualquer motivo temos temperaturas baixas a seguir a uma sequência de dias quentes, é natural que os nossos peixes se sintam, e que mudem de lugar. Devemos ter a flexibilidade de tentar lançar amostras em sítios onde normalmente não arriscamos, porque pode ser aí, num sitio menos vistoso, que está o tal robalo de sonho que procuramos. Há que lançar!



Vítor Ganchinho



2 Comentários

  1. Orlando Bento23 novembro, 2022

    Excelente, aliás como nos habituou, post. Claro, objectivo e ao alcance de compreensão do mais desatento.
    A propósito das amostras pequenas, num workshop no seu estabelecimento, ofereceu-me uma zagaia micro, que agradeci, mas que não me deu aquele bruá. “ minúscula” foi o que me ocorreu, devido ao hábito das 130; 150 e 200g que usava.
    Pois um dia a 80m na costa vicentina, a “ minúscula” preta e prata, cada vez que ia para baixo, trazia robalos de encher o olho.
    Obrigado pela partilha e pela clareza dos textos, que não estão ao alcance de qualquer escriba.
    OB

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    1. Bom dia Orlando

      É dever de todos aqueles que pescam partilhar o seu conhecimento com aqueles que estão a dar os primeiros passos. Aquilo que faço não é mais que isso.
      Com pessoas que já são pescadores consagrados, com muitos milhares de horas de pesca, a abordagem é diferente, e ao nível da troca de experiências pessoais.
      Porque todos aprendemos com os outros. Basta para tanto ter um espirito aberto a novas sugestões, novos conceitos. Como aquilo que se passou consigo quando experimentou o jig mais ligeiro, ...encontrou a forma correta de o utilizar.
      Eu pesco ligeirinho, por vezes demasiado, mas consigo peixes bonitos.
      E a maior parte das pessoas não perdia por experimentar. O problema é que não têm equipamentos para isso, tentam fazê-lo com linhas que são autênticas cordas de atar carga em camiões de transporte de mercadorias pesadas, e quando chegam ao local, aquilo...não desce.
      É natural que não....

      Um grande abraço!
      Vitor

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